Atualização de especialistas sobre o coronavírus SARS-CoV2 que causa a pandemia de COVID-19

20-03-2020

Essa atualização de especialistas sobre o coronavírus SARS-CoV2 sai apenas seis semanas depois de pedirmos a dois virologistas uma declaração de especialista no estado atual da pandemia de coronavírus originada em Wuhan, China. Com a Organização Mundial da Saúde (OMS) atualmente reportando cerca de 180.000 casos confirmados, e mais de 7.000 mortes em 159 países, áreas ou territórios (a partir de 17 de março), pode-se dizer com confiança que a epidemia de COVID-19 se alastrou de forma significativa desde então.

Esse pode ser o maior desafio de saúde pública dos tempos modernos, mas a humanidade está preparada para eventualmente triunfar.”

Nós pedimos a Alfredo Garzino-Demo (Twitter: @MicroviroB), que nos ajudou a escrever a primeira declaração de especialista, para nos atualizar no que mais foi aprendido sobre o vírus SARS-CoV2 e a doença COVID-19:

Declaração de 17 de março de 2020Declaração em inglês

O que mais nós sabemos sobre o vírus que causa a pandemia COVID-19, e o que os cientistas podem fazer para melhor responder à pandemia?

“Nas 15 semanas desde a primeira detecção do vírus SARS-CoV2 e da doença que ele causa, a COVID-19, nós estamos observando surgir uma pandemia. Há lições a serem aprendidas dessa situação, que com sorte serão usadas para evitar ou conter futuros patógenos emergentes.

No entanto, há algumas boas notícias. A primeira foi o quão rápido os epidemiologistas, os especialistas em saúde pública, os trabalhadores da saúde, a indústria e os pesquisadores trabalharam juntos, cada um fazendo a sua parte, para suprimir a pandemia o mais rápido possível. A partir de 15 de março de 2020, uma busca no PubMed revelou que 947 artigos científicos já haviam sido publicados (incluindo comentários ou revisões); e muito mais ficaram disponíveis em forma de preprint – o jeito do século XXI de relatar dados quase em tempo real.

Portanto, o progresso tem sido muito rápido, provavelmente mais rápido do que em outros surtos ou epidemias, e nós aprendemos algumas características importantes desta infecção viral. Dado o rápido avanço das descobertas, é provável que alguns dados mais recentes não estejam incluídos aqui, e como pretendemos destacar alguns aspectos que consideramos particularmente importantes, essa não é, de forma alguma, uma revisão abrangente do assunto.

Uma questão importante é se a transmissão irá diminuir naturalmente com o aumento de temperatura no hemisfério norte … As próximas semanas irão ajudar a clarear essa intrigante e bem-vinda possibilidade”

Um modelo 3D do vírus SARS-CoV2 (domínio público).

Já se sabe que existem indivíduos infectados assintomáticos, então a transmissão pode ocorrer a partir de pessoas que aparentemente estão saudáveis ([1][2][3][4]); além disso, mesmo quando os sintomas acabam aparecendo, o período assintomático pode durar até duas semanas, e em alguns casos, mais tempo ainda ([4][5][6]). Existem evidências de que o vírus pode infectar, além do trato respiratório, células do trato gastrointestinal (boca, esôfago, estômago e intestino) ([7][8]).

A transmissão indireta através de objetos (fômites) já foi documentada [9], e de acordo com um estudo, a meia-vida do vírus em algumas superfícies (como plástico) é de mais de 15 horas, podendo ser detectado até 3 dias depois [10].

Até agora, casos de transmissão vertical ou de origem materna ainda não foram observados ([11][12]). Embora se saiba que a idade avançada é um fator de risco para aumentar a gravidade da doença e, consequentemente, as chances de um desfecho fatal, a mortalidade na faixa etária de 0 a 9 anos é praticamente zero, e há evidências de que os homens têm um risco maior de desenvolver a forma grave e de morrer pela doença do que as mulheres ([13]). Uma questão importante é se a transmissão irá naturalmente diminuir com o aumento de temperatura no hemisfério norte, visto que os pontos focais iniciais da pandemia foram em regiões que apresentam temperaturas e índices de umidade similares [14]. As próximas semanas irão clarear essa intrigante e bem-vinda possibilidade.

Do ponto de vista terapêutico, a droga experimental Remdesivir foi capaz de inibir um parente do coronavírus SARS-CoV2, o MERS-CoV (a causa da Síndrome Respiratória do Oriente Médio – em inglês, Middle East Respiratory Syndrome ou MERS – em 2012 ([15][16]), em testes in vitro e in vivo em modelos animais, e agora está em fase de testes clínicos no Estados Unidos e na China. Além disso, essa droga está disponível para uso compassivo em pacientes com COVID-19 ([17][18]), e evidências preliminares mostram que Remdesivir tem alguma eficácia em pacientes com COVID-19 ([19][20]). Adicionalmente, cloroquina demonstrou eficiência em ensaios in vitro, e está sendo utilizada amplamente, consistindo em uma combinação de Lopinavir e ritonavir, tendo este último menos estudos corroborativos ([18][21][22]).

Do ponto de vista de prevenção, os primeiros testes clínicos para uma vacina contra SARS-CoV2 estão prestes a começar, e em breve novos alvos-candidatos vacinais vão surgir ([23]). Vale ressaltar que os macacos rhesus que foram infectados experimentalmente com SARS-CoV2 e que sobreviveram à infecção, resistiram à uma subsequente reinfecção. Essa descoberta é muito promissora, pois sugere que é possível induzir imunidade contra o vírus ([24]).

… embora o momento seja terrível e a adesão às práticas de prevenção, começando pelo distanciamento social, sejam absolutamente necessárias, as pesquisas básicas, clínicas e de vacinas estão progredindo com vigor (e generosidade)”.

Predição de estrutura da proteína não-estrutural 4 (em inglês non-structural protein 4 ou nsp4) do vírus SARS-CoV2 (Estimativa da pontuação-TM = 0,53). Participa da montagem de vesículas citoplasmáticas de membrana dupla que são induzidas pelo vírus e que são necessárias para a replicação viral. De Chengxin Zhang, Wei Zheng, Xiaoqiang Huang, Eric W. Bell, Xiaogen Zhou, Yang Zhang (2020).

Análises da estrutura de todas as proteínas virais já estão disponíveis [25], incluindo estudos de interação entre a proteína viral spike e a enzima conversora de angiotensina 2 (ECA2), que é o receptor do vírus na superfície da célula humana ([26][27]); polimerases virais [28] e sua maior protease [29]. A compreensão dessas estruturas será importante para o planejamento racional de medicamentos e, em geral, para permitir estudos sobre abordagens preventivas e terapêuticas.

Em conclusão, embora o momento seja terrível e a adesão às práticas de prevenção, começando pelo distanciamento social, sejam absolutamente necessárias, as pesquisas básicas, clínicas e de vacinas estão progredindo com vigor (e generosidade). Os cientistas têm sido extremamente proativos na resposta à pandemia do SARS-CoV2. O compartilhamento de dados e a colaboração entre as instituições públicas e privadas são ações necessárias para aumentar ainda mais o ritmo do progresso.

Esse pode ser o maior desafio de saúde pública dos tempos modernos, mas a humanidade está preparada para eventualmente triunfar.”

Alfredo Garzino-Demo é professor associado do Instituto de Virologia Humana e do Departamento de Microbiologia e Imunologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Maryland, EUA; e da Universidade de Pádua (Itália) e é editor chefe da nossa revista Pathogens and Disease.

Translation provided by Tatiana Pinto and Maria Leticia Bonatelli of the Volunteer Translation Team 

Mais recursos:

Painel de Controle da Organização Mundial da Saúde (OMS) para rastreamento de casos COVID-19

Painel de Controle da John Hopkins University (JHU) para rastreamento de casos COVID-19

Todas as reações de especialistas à pandemia de COVID-19 do Science Media Centre UK (em inglês): https://www.sciencemediacentre.org/tag/covid-19/ 

Todas as reações de especialistas à pandemia de COVID-19 do Science Media Center Germany (em alemão): https://www.sciencemediacenter.de/alle-angebote/coronavirus/

Pesquisa:

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