Angelina Fanny Hesse foi a mente criativa por trás do uso de ágar em meios de cultura de microrganismos. Embora o ágar seja um ingrediente indispensável em qualquer laboratório de microbiologia, a contribuição de Angelina permanece amplamente desconhecida. Neste blog, Vanesa Ayala conta a história desta descoberta. #MicrobiologyIsEverywhere
*To the original English version: #FEMSmicroBlog: Got agar? Say thanks to Angelina Hesse!*
É apenas mais um dia no laboratório. Há um odor doce de fermento no ar.
Bip bip bip.
A autoclavagem terminou e você prepara 50 placas de ágar para os experimentos desta semana. Enquanto espera as placas esfriarem e o ágar solidificar, você olha para essa substância amarelada parecida com gelatina e pensa: “Quem inventou isso?” É uma ideia tão bacana, e é tão essencial para qualquer trabalho em microbiologia.
Como um microbiologista, você consegue imaginar a vida sem ágar?
Fatias de batata, gelatina ou ágar? Pergunte a Lina Hesse.
Angelina (Lina) Fanny Hesse (1850-1934) foi a primeira pessoa a propor o uso de ágar como meio de cultura para crescimento e isolamento de bactérias. Sua contribuição à microbiologia é crucial, porém ainda não é amplamente reconhecida.
Antes de Lina Hesse, o trabalho de classificar microrganismos era tão complexo que Lineu agrupou todas as bactérias na ordem Chaos. Na época, era extremamente difícil identificar microrganismos individualmente porque não havia um meio adequado para crescê-los e isolá-los em laboratório (e também porque, obviamente, análises moleculares ainda não estavam disponíveis).
Os meios de cultura incluíam polenta, clara de ovo coagulada, carne, fatias de batata e gelatina. Você consegue se imaginar cultivando suas bactérias em polenta? Boa sorte com isso… Gelatina também tem seus desafios: ela derrete a 37°C, e pode ser degradada por bactérias.
Antes de Lina Hesse, o trabalho de classificar microrganismos era tão complexo que Lineu agrupou todas as bactérias na ordem Chaos.
Lina Hesse foi uma ilustradora científica e assistente técnica que trabalhava de forma não remunerada para seu marido Walther Hesse, que era parte da equipe do laboratório de Robert Koch na Alemanha. Walther e Robert Koch estavam tendo dificuldades para isolar culturas bacterianas puras e que fossem duradouras. Eles usavam fatias de batata e gelatina.
Lina Hesse, que ajudava na produção do meio de cultura bacteriano para os projetos de Walther, sugeriu o uso de ágar, um extrato de algas marinhas, como alternativa para obter meios de cultura mais estáveis. Ela conheceu o ágar-ágar através de amigos da família que haviam morado em Java (Indonésia), onde o extrato de algas marinhas era utilizado na cozinha e faziam com que os pudins não derretessem, mesmo sob as altas temperaturas do Sudeste Asiático.
A utilização do ágar acabou sendo a solução para todos os problemas! Robert Koch imediatamente reconheceu seus benefícios, e usou ágar para isolar o famoso bacilo da tuberculose. Nem Lina nem Walther Hesse levaram crédito pela inclusão do ágar na microbiologia.
Por que o agar é tão essencial na microbiologia?
Agar representa a solução perfeita porque pode ser misturado com meios de cultura nutritivos, permanece sólido em altas temperaturas, e é transparente, indigerível por microrganismos e esterilizável.
Pela primeira vez, microbiologistas conseguiam controlar e conter o crescimento microbiano de forma que bactérias podiam ser facilmente isoladas. Este processo aparentemente simples se tornou uma ferramenta essencial para os microbiologistas. Isolar e cultivar bactérias como culturas puras é frequentemente um pré-requisito para sua identificação e estudo.
Atualmente, o ágar é utilizado até para fazer arte! Se você der uma olhada na competição de arte em ágar organizada pela Sociedade Americana de Microbiologia (American Society for Microbiology), você ficará hipnotizado.
O meio de Frau Hesse
Muitos subestimaram o achado de Lina Hesse. Mas o fato dela trabalhar como assistente de laboratório significava que ela tinha experiência com procedimentos técnicos. Ela conhecia a área, seus desafios e necessidades técnicas. O que alguns podem considerar como um palpite de sorte, foi na verdade o que hoje chamamos de resolução de problemas (ou troubleshooting). Ela sabia o que estava fazendo.
Para um microbiologista, uma vida (de trabalho) sem ágar é inimaginável. Contudo, imagine se todos em um laboratório de microbiologia dissessem: “De quantas placas de ágar Frau Hesse você precisa?
Em 1938, dois pesquisadores e historiadores reconheceram a importância da contribuição de Lina Hesse e sugeriram: ‘Poderia o “ágar simples” a partir de agora ser designado como “meio de Frau Hesse”?’ Sua contribuição à bacteriologia a torna imortal.’
Para um microbiologista, uma vida (de trabalho) sem ágar é inimaginável. Contudo, imagine se todos em um laboratório de microbiologia dissessem: “Tenho que esperar a solidificação do meio de Frau Hesse.” ou “De quantas placas FH você precisa?”
Isso consolidaria a contribuição essencial de Lina Hesse à microbiologia entre outros trabalhos monumentais de microbiologistas pioneiros como Walther Hesse, Julius Richard Petri e Robert Koch. Nós devemos honrar quem é digno de honra.
- Leia também: 10 Microbiologistas Mulheres Que Você Não Conhece, Mas Deveria (texto em inglês) no blog do Website do Dia International do Microrganismo (em inglês)
Vanesa Ayala-Nunez tem mais de dez anos de experiência como cientista na área de doenças infecciosas. Trabalhando na interface entre Virologia, Imunologia e Biologia Celular, ela lidou com vários patógenos humanos assustadores. Fez seu PhD na Universidade de Groningen na Holanda e atuou como Postdoc em IRIM na França. Vanesa é atualmente uma Editora Científica, trabalhando na França e na Alemanha. Ela colabora com diferentes projetos de comunicação científica e participa do Time de Tradutores Voluntários da FEMS.
Este blog foi traduzido para Português por Tatiana Pinto e Maria Bonatelli do Time de Tradutores Voluntários da FEMS.
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